Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Proposição: PLEI - Projeto de Lei
Número: 120/2008  -  Processo: 0150-10 1987

RAZÕES DE VETO

Razões de Veto

Vejo-me compelido a vetar integralmente o Projeto de Lei que “Altera disposições da Lei nº 6612, de 16 de outubro de 1984”.

Há inconstitucionalidade formal subjetiva da proposição - também chamada de vício de iniciativa ou de competência - , que verifica-se de vez que a iniciativa legislativa prevista restou desrespeitada.

Há, também, inconstitucionalidade material por lesão aos Princípios Constitucionais da Impessoalidade, da Legalidade, da Isonomia e da Obrigatoriedade de Licitar, além de afronta ao Interesse Público.

Há, ainda, ilegalidade por desrespeito à Lei Complementar nº 95/95 e também por atentar contra a sistematização da própria Lei nº 6612/84. 1 - A primeira inconstitucionalidade advém de pertencer ao Poder Executivo do Município a exclusividade da competência para propor projetos de lei objetivando a permissão de serviços públicos, bem como a fixação das regras para tais serviços. Tal regulação constitui função eminentemente administrativa, precípua do Executivo, e que não pode ser usurpada pelo Legislativo, sob pena de infração aos Princípios da Separação e Independência dos Poderes - Pilares do Estado, conforme art. 2º da Constituição Brasileira.

Não foi por outro motivo que a Suprema Corte decidiu pela inconstitucionalidade de lei municipal similar, de iniciativa da Câmara: "Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei municipal de iniciativa de vereador. Regime de concessão ou permissão de serviço público. Procedência da Ação. A faculdade ou competência de iniciativa para propor mensagem sobre Lei Municipal que objetive concessão ou permissão dos serviços públicos é exclusiva do poder executivo Municipal. É inconstitucional a Lei Municipal de iniciativa de vereador, mesmo sancionada pelo Prefeito Municipal quando objetive concessão ou permissão de serviço público." (Ac. 92002579-8, Rel. Juiz Marcos Otávio Araújo de Novaes, junho – 1992). No âmbito municipal, o serviço público de táxi é prestado (consoante as determinações da Lei nº 6612/84 e alterações posteriores), por meio do instituto da permissão - ato administrativo discricionário e precário, pelo qual a Administração delega a particular a prestação de serviços de utilidade pública, cuja execução lhe incumbe.

Sendo o Executivo detentor da titularidade da execução do serviço, igualmente cabe ao Executivo alterar as regras para sua execução pelos permissionários. Consoante o caput do art. 85 da Lei Orgânica Municipal, constitui atribuição do Prefeito, como Chefe da Administração, a adoção de medidas administrativas de interesse público. No exercício desta função, cabe ao Prefeito a outorga da permissão e definição e modificação de suas regras. É o que prevê a Lei Orgânica Municipal, ao atribuir ao Chefe do Executivo, no art. 86, VII, a função de "permitir ou autorizar a execução de serviços públicos por terceiros" e, no art. 192, a competência quanto a “concessão e regulamentação dos serviços de transporte coletivo urbano”. No mesmo sentido, a Lei Municipal nº 10.518, de 04 de agosto de 2003 ("Dispõe sobre a criação, objetivos, organização e estrutura do Sistema de Regulação e Gestão do Transporte e Trânsito de Juiz de Fora – SISTTRAN/JF e da Agência de Gestão do Transporte e Trânsito de Juiz de Fora – GETTRAN/JF, fixa princípios e diretrizes de gestão e dá outras providências"), no Parágrafo único do art. 7º, estabelece que constituem "atribuições exclusivas do Chefe do Poder Executivo, conforme estabelece o art. 86 da Lei Orgânica do Município de Juiz de Fora, as delegações dos serviços municipais de transporte de passageiros, bem como a definição da política tarifária do município". Saliente-se que o vício de iniciativa contamina todo o processo legislativo, sendo que nem mesmo sanção do Prefeito poderia convalidar o processo.

Viciado o processo legislativo no nascedouro, os atos dele decorrentes restam prejudicados. É o posicionamento expresso na jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal Federal: “Inconstitucionalidade formal reconhecida em face do vício de iniciativa da Lei impugnada, de origem parlamentar, que não é convalidado nem mesmo pela sanção do Chefe do Poder Executivo.” (STF – Pleno – ADIN nº 1963/PR – Rel. Min. Maurício Corrêa – DJ – Seção I – 07/05/1999, p. 01.) “Inconstitucionalidade formal frente à EC 01/69, que exigia, em seu art. 57, a iniciativa do Chefe do Executivo, em se tratando de lei financeira. Exigência que, conforme a jurisprudência do STF, não é suprida por haver-se verificado a sanção da lei municipal.” (TF – Pleno – RE nº 18585/SP – Rel. Min. Ilmar Galvão – DJ – Seção I – 18/06/1999, p. 22.) No mesmo diapasão, a doutrina do Direito Constitucional, por Alexandre de Moraes: “Outra questão importante referente aos projetos de lei de iniciativa exclusiva do Presidente da República é saber se a sanção presidencial supre o vício de iniciativa na apresentação do projeto. Assim, supondo que um projeto de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo tenha sido apresentado por um parlamentar, discutido e aprovado pelo Congresso Nacional, quando remetido à deliberação executiva, a eventual aquiescência do Presidente da República, por meio da sanção, estaria suprindo o inicial vício de constitucionalidade? Acreditamos não ser possível suprir o vício de iniciativa, pois tal vício macula de nulidade toda a formação da lei, não podendo ser convalidado pela futura sanção presidencial. A súmula 5 do Supremo Tribunal Federal, que previa posicionamento diverso, foi abandonada em 1974, no julgamento da Representação nº 890-GB, permanecendo, atualmente, a posição do Supremo Tribunal Federal pela impossibilidade de convalidação.” (Direito Constitucional. 13ª ed.. São Paulo: Atlas, 2003, pp. 531 e 532.) Cabe ressaltar, por fim, que é perfeitamente legítima e democrática a acolhida, pelos Senhores Edis, de reivindicações dos permissionários de táxi. Considerando justas as reivindicações, cabe ao Legislativo encaminhar os pleitos à análise do Executivo, a título de indicação. O procedimento coaduna-se com o Princípio da Harmonia entre os Poderes.

Entretanto, é certo que alterações que se façam necessárias na prestação de serviços em tela devem partir do Poder Executivo, titular de iniciativas deste jaez, sob pena de macular o Princípio da Separação entre os Poderes, por inafastável acinte à autonomia do Executivo. Já por isto, por razões jurídicas, veto o Projeto de Lei e solicito à Egrégia Câmara que, em reexame da matéria, mantenha a decisão. 2 - Não bastasse a matéria apontada (e já basta), não é demais apontar outras inconstitucionalidades e ilegalidades que estão a macular o Projeto de Lei em questão, reforçando a justificação do veto apontado como necessário, e que deram sustentação a manifestação política do Superintendente da GETTRAN-JF, no sentido de ser vetada a proposição legal. a) A natureza jurídica intuito personae da Permissão de Táxi, no serviço público local está vinculada à execução da atividade pelo próprio particular detentor da delegação, posto que a sua destituição equivaleria extinguir requisito essencial e contínuo para a permanência de validade da outorga proferida ao particular. b) O Projeto de Lei em questão gera contradição com o restante da legislação pertinente, que obriga que o Permissionário atenda a características peculiares aos motoristas profissionais, em especial a devida Carteira Nacional de Habilitação, bem como curso de qualificação próprio (art. 5º, I e art. 51 da Lei nº 6612/84 c/c art. 51 do Decreto nº 3180/84).c) Outra contradição legislativa, aliada a inconstitucionalidade, também seria causada em razão da figura existente do motorista auxiliar, que traduz o motorista, não permissionário, que poderá ajudar na prestação da atividade de táxi. Não quer dizer que os motoristas auxiliares possam substituir plenamente o Permissionário do exercício pessoal da atividade, o que seria o mesmo que delegar o serviço público a outrem sem respeito aos princípios da impessoalidade, isonomia e da obrigatoriedade de licitar (art. 37, caput, c/c art. 175, CRFB/88 – inconstitucionalidade por lesão aos preceitos constitucionais). d) Ao ser revogada uma das hipóteses, não taxativas, mas meramente exemplificativas, de término da permissão, estipuladas no art. 9º, cria-se uma falsa situação em que o Permissionário não mais precisará executar a atividade pessoalmente, o que não é verdade, haja vista a definição de permissionário (art. 1º, III – faça do sérvio sua atividade profissional), cumulada com o disposto no art. 9º, II (não cumprimento das condições de outorga estabelecidas e das normas regulamentares – Lei nº 6612/84 e Decreto nº 3180/84). e) Não seria mais necessária, para a renovação anual da permissão, a apresentação legalmente exigida de documentos como CNH e curso de qualificação/capacitação (geraria mais uma contradição dentro da legislação vigente). f) A permanência em vigor dos demais dispositivos regulamentares da Lei 6612/84, geraria, de qualquer maneira, a necessidade do atendimento dos requisitos pessoais para ser e continuar sendo permissionário; g) A própria justificativa da propositura do PL nº 120 pode ser fadada de contraditória, pois manifesta que os Permissionários deverão estar previamente inscritos na GETTRAN, mas para isso será imprescindível o atendimento dos requisitos legais como apresentação de CNH curso de qualificação/capacitação. h) Então, a presente proposição de alteração da Lei do Táxi, colocada de forma minimalista como foi, não melhora o sistema de transporte individual, mas, ao contrário, leva a norma local a um conflito interno entre seus dispositivos, que devem estar sempre em consonância, face à lógica e à hermenêutica sistemática que toda Lei deve ter para atender à sua finalidade, bem como torna a aplicação e o entendimento da norma obscura, ao invés de clareá-lo ainda mais. i) Em tal contexto, o Projeto de Lei é ilegal frente à Lei Complementar nº 95/95, por ferir o art. 11, II, a, ao gerar confusão com o objetivo da Lei nº 6612/84, que se pretende modificar. j) Em razão de cada uma (e de todas) das contradições aqui apontadas, o Projeto de Lei também é ilegal perante a sistematização da própria Lei nº 6612/84, trazendo diversos conflitos internos até então inexistentes.k) Por conseguinte, está o Projeto de Lei em questão eivado de inconstitucionalidade, face ao desrespeito ao princípio da legalidade, explicitado no art. 37, caput, da nossa Carta Magna. l) Sob outro aspecto, o Projeto de Lei em estudo apresenta-se frontalmente contrário ao interesse público, notadamente porquanto permitirá o arrendamento camuflado das permissões, transformando o serviço público em negócio escuso, bastante lucrativo para alguns, o que certamente desvia-se da sua finalidade. m) Importa, por fim, informar que já existe Projeto de Lei em trâmite na Câmara Municipal, de autoria do Poder Executivo, sob a mensagem nº 3709/2008, que aborda de forma prudente e justificada os casos sui generis, que permitirão a não aplicação do art. 9º, VIII, bem como a desnecessidade de apresentação de alguns documentos e requisitos, quando o permissionário, por motivos alheios à sua vontade, como em situações de doenças devidamente comprovadas, não puder exercer a atividade pessoalmente, permanecendo como responsável pela Permissão. Tal Projeto de Lei, de autoria do Executivo, visa o preenchimento de lacuna na Lei nº 6612/84, facilitando a fiscalização e dando maior dignidade aos Permissionários.

Diante do exposto, as inconstitucionalidades e as ilegalidades do Projeto impõem o presente veto jurídico, o qual solicito à Egrégia Câmara que, em reexame da matéria, seja mantido.

Prefeitura de Juiz de Fora, 10 de outubro de 2008.

a) JOSÉ EDUARDO ARAÚJO - Prefeito de Juiz de Fora.



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