Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Proposição: PLEI - Projeto de Lei
Número: 213/2023  -  Processo: 10084-00 2023

RAZÕES DE VETO

 RAZÕES DE VETO­ - Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do art. 39, §1º da Lei Orgânica dessa municipalidade e, em que pese reconheça o merecimento da iniciativa do vereador autor, vejo-me compelida a vetar integralmente o Projeto de Lei nº 213/2023, tendo em vista as inconstitucionalidades manifestas que recaem sobre o seu conteúdo. Isso porque a citada propositura, ao pretender instituir uma determinada política atrelada, essencialmente, à criação de uma Câmara de Prevenção e Resolução Administrativa de Conflitos, se imiscuiu em matéria na qual a Lei Orgânica Municipal determinou a iniciativa da proposição, privativamente, à Chefe do Executivo (art. 36, III da LOM/JF[1] ), bem como é possível verificar que a principal intenção do PL (criação de Câmara administrativa de resolução de conflitos) resulta em interferência indevida nas atribuições que estão sob a guarida de Poder instituído diverso, desrespeitando a competência própria do Poder Executivo e afrontando, por conseguinte, o princípio constitucional da separação de poderes (art. 2º CF/88). De acordo com a Lei Federal nº 13.140/2015 (art.32) os Municípios poderão criar câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos, no âmbito dos respectivos órgãos da Advocacia Pública. Sendo assim, a criação de tal órgão (que seria inserido na estrutura da Procuradoria Geral do Município), depende de Lei municipal elaborada e encaminhada pelo Poder Executivo (art. 36, III da LOM/JF). Ainda no que se refere aos vícios do PL que ora se veta, importante pontuar que este contempla diversas normas meramente autorizativas[2] e de acordo com o entendimento majoritário do Poder Judiciário (e até mesmo do Poder Legislativo no âmbito Federal - CCJ), estas não seriam consideradas constitucionais, senão vejamos: RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO E SEPARAÇÃO DE PODERES. - O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de poderes, desconstituir, por lei, atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação ultra vires do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais” (STF, ADI-MC 2.364-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-08-2001, DJ 14-12-2001, p. 23) COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS FEDERAIS- SÚMULA DE JURISPRUDÊNCIA 1 - PROJETOS AUTORIZATIVOS 1. Entendimento: 1.1. Projeto de lei de autoria de Deputado ou Senador, que autoriza o Poder Executivo a tomar determinada providência, que é de sua competência exclusiva, é inconstitucional. “LEIS AUTORIZATIVAS - INCONSTITUCIONALIDADE - Se uma lei fixa o que é próprio da Constituição fixar, pretendendo determinar ou autorizar um Poder constituído no âmbito de sua competência constitucional, essa lei e inconstitucional. - não só inócua ou rebarbativa, - porque estatui o que só o Constituinte pode estatuir O poder de autorizar implica o de não autorizar, sendo, ambos, frente e verso da mesma competência - As leis autorizativas são inconstitucionais por vicio formal de iniciativa, por usurparem a competência material do Poder Executivo e por ferirem o princípio constitucional da separação de poderes. “VÍCIO DE INICIATIVA QUE NÃO MAIS PODE SER CONSIDERADO SANADO PELA SANÇÃO DO PREFEITO - Cancelamento da Súmula 5, do Colendo Supremo Tribunal Federal”. TJSP, ADI 142.519-0/5-00, Rel. Des. Mohamed Amaro, 15-08-2007). “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALÍDADE - LEI Nº 2.057/09, DO MUNICÍPIO DE LOUVEIRA - AUTORIZA O PODER EXECUTIVO A COMUNICAR O CONTRIBUINTE DEVEDOR DAS CONTAS VENCIDAS E NÃO PAGAS DE ÁGUA, IPTU, ALVARÁ A ISS, NO PRAZO MÁXIMO DE 60 DIAS APÓS O VENCIMENTO - INCONSTITUCIONALÍDADE FORMAL E MATERIAL - VÍCIO DE INICIATIVA E VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - INVASÃO DE COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO - AÇÃO PROCEDENTE. A lei inquinada originou-se de projeto de autoria de vereador e procura criar, a pretexto de ser meramente autorizativa, obrigações e deveres para a Administração Municipal, o que redunda em vício de iniciativa e usurpação de competência do Poder Executivo. Ademais, a Administração Pública não necessita de autorização para desempenhar funções das quais já está imbuída por força de mandamentos constitucionais” (TJSP, ADI 994.09.223993-1, Rel. Des. Artur Marques, v.u., 19-05-2010). “Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Municipal nº 2.531, de 25 de novembro de 2009, do Município de Andradina, 'autorizando' o Poder Executivo Municipal a conceder a todos os alunos das escolas municipais auxílio pecuniário para aquisição de material escolar, através de vale-educação no comércio local. Lei de iniciativa da edilidade, mas que versa sobre matéria reservada à iniciativa do Chefe do Executivo. Violação aos arts. 5º, 25 e 144 da Constituição do Estado. Não obstante com caráter apenas 'autorizativo', lei da espécie usurpa a competência material do Chefe do Executivo. Ação procedente” (TJSP, ADI 994.09.229479-7, Rel. Des. José Santana, v.u., 14-07-2010). Além disso, percebemos que a propositura em questão também se equivoca quanto aos contornos do próprio federalismo pátrio, eis que o Projeto apresenta diversas normas de natureza processual, violando o art. 22, I, da CF/88[3] ao dispor, por exemplo, sobre os princípios da conciliação, os objetivos e o objeto da Câmara de Prevenção e Resolução Administrativa de Conflitos, PRESCRIÇÃO, os limites da mediação ou da conciliação, necessidade de homologação em juízo e oitiva do Ministério Público, bem como as hipóteses de impedimentos do conciliador. Mesmo que seja possível aos municípios legislarem sobre aspectos relacionados à mediação e conciliação no âmbito local, de acordo com o art. 30 da CF/88, compete aos municípios, considerando a existência de Lei Federal sobre o tema, suplementar a legislação federal, no que couber. Acontece que a União já estabeleceu as normas gerais para os procedimentos pretendidos no PL nº 213/2023, através da Lei Federal nº 13.140/2015 que dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública, sendo importante pontuar também que diversos artigos do PL ora vetado são meras reproduções de dispositivos da Lei Federal, como por exemplo dos art. 1º, par. único; 2º, incisos I a VIII, 6º; 7º; 10, dentre outros, todos da Lei Federal mencionada. O PL 213/2023 também regulamenta questões já positivadas no Código de Processo Civil (Lei Federal nº 13.105/15), em especial: arts. 3º, § 3º; 165 a 175 (Dos Conciliadores e Mediadores Judiciais). Portanto, considerando a existência de norma geral de abrangência federal e a competência privativa da União para legislar sobre o tema (normas de direito processual), a Lei 13.140/2015 (art. 32) permitiu que os Municípios criem câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos, no âmbito dos respectivos órgãos da Advocacia Pública, o que conforme já pontuado, tendo em vista que se trata de criação de um órgão na estrutura do executivo municipal, depende de Lei que deve ser elaborada e encaminhada à esta respeitável Câmara Municipal pelo Poder Executivo. Além dos vícios já reportados acima, com relação à questão financeira e orçamentária, entendo que o Projeto de Lei em comento, caso não houvessem os vícios formais apontados, deveria ser acompanhado do respectivo estudo de impacto orçamentário relacionado à implementação da política proposta, visto que a criação da Câmara administrativa de resolução de conflitos importa em despesas de caráter continuado, nos exatos termos da Lei de Responsabilidade Fiscal (arts. 15,16 e 17). Assim sendo, face ao teor dos apontamentos firmados e considerado o mandamento expresso da legislação de regência que se coaduna com a posição pacificada pela jurisprudência pátria, conclui-se que o Projeto de Lei epigrafado não pode ser sancionado, eis que maculado por inconstitucionalidade intransponível, razão pela qual apresentamos VETO TOTAL aos seus termos, devolvendo o assunto ao reexame desta Colenda Casa Legislativa.

Prefeitura de Juiz de Fora, 08 de fevereiro de 2024.

a) MARGARIDA SALOMÃO - Prefeita de Juiz de Fora.



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