Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Proposição: PLEIC - Projeto de Lei Complementar
Número: 48/2023  -  Processo: 10071-00 2023

RAZÕES DE VETO

 Em conformidade com o disposto no art. 39, §1º da Lei Orgânica desta municipalidade, apresento VETO TOTAL ao Projeto de Lei Complementar nº 48/2023, considerando que sobre o mesmo recaem vício de inconstitucionalidade e de legalidade insuperáveis, conforme se passa a demonstrar. Em linhas gerais, é forçoso se concluir que, ao buscar estabelecer a concessão de incentivos para execução de reformas e novas construções a serem deferidos aos estabelecimentos de saúde públicos ou privados pertencentes à rede complementar de saúde pública deste Município, referido projeto - de iniciativa de membro do Poder Legislativo - o fez em usurpação de competência deferida privativamente ao Poder Executivo, posto que a matéria nele regulamentada, de caráter notadamente administrativo, está dentre aquelas reservadas à esfera de iniciativa afeta a este último poder instituído. E semelhante conclusão se depreende das razões que passo a elucidar. Sobre o tema albergado pelo Projeto de Lei Complementar analisado imperioso se reconhecer que a Carta Magna deferiu aos Municípios a competência para planejar e executar as suas respectivas políticas de desenvolvimento urbano, conforme mandamento expresso insculpido em seu art. 182. Todavia, em que pese a referida delegação de competências tenha sido firmada na seara constitucional de forma ampla, torna-se de todo necessário que se faça uma interpretação sistêmica do comando vergastado, de forma a compatibilizá-lo com as demais disposições que compõem o ordenamento jurídico vigente, principalmente aquelas que se fazem com vistas à preservação de outro princípio de viés igualmente constitucional, a saber, o “princípio da separação dos poderes”. E isso porque, numa interpretação superficial que se faça da delegação de competência material constitucionalmente realizada e do teor do que consta da Lei Orgânica Municipal, principalmente em seu art. 26, incisos XIII e XVI, pode-se chegar à errônea conclusão de que ao Poder Legislativo fora atribuída a iniciativa plena e irrestrita para deflagar toda e qualquer espécie de propositura que trate de matéria urbanística, desconsiderando que, se assim considerado, estar-se-ia conferindo um salvo conduto para que o citado Poder instituído avocasse para si o tratamento de matérias de cunho notadamente administrativo, as quais, pelo já mencionado Princípio da Separação dos Poderes, estão sob a guarida privativa do Poder Executivo.  E semelhante conclusão não é, de forma alguma, procedente, posto que a natureza encerrada por projetos de lei desta monta é, incontroversamente, administrativa, fato que os colocam sob a guarida inafastável da iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo Municipal. Corroborando a conclusão firmada, manifestou-se o Egrégio TJMG (ADI 1.0000.13.054022-2/000), em decisão confirmada pelo STF (ARE 1.077.116/MG): “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO PRESENTE. LEI MUNICIPAL. REGULARIZAÇÃO DE CONSTRUÇÕES, REFORMAS, MODIFICAÇÕES OU AMPLIAÇÕES DE EDIFICAÇÕES. COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO. VÍCIO DE INICIATIVA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. INCONSTITUCIONALIDADE PRESENTE. 1. A possibilidade jurídica da pretensão é aspecto puramente processual e consiste na existência abstrata de previsão do tipo de tutela jurisdicional pretendida ordenamento jurídico. 2. Compete ao município legislar sobre planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, conforme preveem os artigos 170 e 171 da Constituição do Estado de Minas Gerais. 3. Incide em inconstitucionalidade a lei, resultante de iniciativa do Poder Legislativo, que dispõe sobre a regularização de construções, reformas, modificações ou ampliações de edificações, porque trata de matéria cuja iniciativa compete privativamente ao chefe do Poder Executivo. Assim, houve afronta ao princípio constitucional da separação dos poderes. 4. Pretensão inicial da ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.” Para além da citada constatação apta a revelar o vício de iniciativa que recai sobre o projeto analisado - a qual, por si só, já seria suficiente a fundamentar o veto jurídico integral ao seus termos - não se pode desconsiderar que a analisada propositura padece de outras ilegalidades que exigem o seu imediato rechaço, como a frontal violação à tese contida no Tema 348, fixado em sede de Repercussão Geral pelo STF, cujo teor se transcreve: “Os municípios com mais de vinte mil habitantes e o Distrito Federal podem legislar sobre programas e projetos específicos de ordenamento do espaço urbano por meio de leis que sejam compatíveis com as diretrizes fixadas no plano diretor”. Pela leitura do excerto, verifica-se que toda e qualquer regulamentação que porventura venha a se fazer acerca de programas, projetos e que pretendam fixar diretrizes à ordenação do espaço urbano, ainda que em pontos específicos, deve se dar em estrita observância às orientações traçadas no Plano Diretor, por ser esse o instrumento básico do desenvolvimento da política urbana. E, no caso analisado, é de hialina clareza que o projeto de lei em referência se deu ao arrepio das prescrições do vigente Plano Diretor, posto que desconsiderou, por completo, a exigência veiculada pelo art. 185, II, “b” da Lei Complementar nº 82/2018, que exige prévia submissão ao Conselho Municipal de Políticas Urbanas/COMPUR de toda e qualquer proposta que tenha por objeto revisar a legislação urbanística, o que certamente é o intento do citado PL, eis que o mesmo altera sobremaneira os parâmetros atrelados ao direito de construir e aspectos correlatos para uma categoria específica de interessados. Assim, diante dos apontamentos firmados, conclui-se que o Projeto de Lei Complementar epigrafado não pode ser sancionado, em virtude do vício de constitucionalidade que recai sobre o seu conteúdo, razão pela qual apresentamos VETO TOTAL aos seus termos, devolvendo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa Legislativa.

Prefeitura de Juiz de Fora, 09 de janeiro de 2024.

a) MARGARIDA SALOMÃO - Prefeita de Juiz de Fora.



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