Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Proposição: PLEIC - Projeto de Lei Complementar
Número: 15/2019  -  Processo: 7614-03 2016

RAZÕES DE VETO

 Vejo-me compelida a vetar, integralmente, o Projeto de Lei Complementar nº 15/2019, que altera a Lei Complementar nº 62, de 26 de junho de 2017, que Altera o rol de atividades permitidas em Zona Residencial - 2 e Zona Residencial -3. O Projeto de Lei Complementar propõe a alteração do art. 1º para acrescentar o inciso IV, autorizando as atividades imobiliárias administradoras de imóveis e congêneres em áreas de ZR2 e ZR3. Em que pese a competência legislativa prevista no artigo 30, incisos I e II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, prevendo a competência dos Municípios para legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e estadual no que couber, há que se observar, numa interpretação sistemática da Constituição Federal, o disposto no art. 182 da Carta Magna que determina que a política de desenvolvimento urbano será executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas por lei, tendo por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. Embora, numa análise primeira, se pudesse considerar que o Poder Público Municipal, através de sua Casa Legislativa, estaria atuando nos limites traçados pela Constituição Federal, bem como com fundamento no artigo 26 da Lei Orgânica do Município, há que se registrar que o objeto deste Projeto de Lei Complementar, por sua natureza, se refere a atividade tipicamente administrativa. Assim, importante registrar que a competência estabelecida nos mencionados dispositivos legais não pode confrontar as competências típicas da atividade administrativa - típica do Poder Executivo, além das matérias condicionadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo. Em outras palavras, quando o art. 26 da LOM prevê que a Câmara Municipal pode “legislar sobre quaisquer matérias de interesse e competência legal do Município”, esta função normativa não pode usurpar a atividade tipicamente administrativa, legislando sobre atribuição reservada ao Poder Executivo, em flagrante afronta ao Princípio da Separação dos Poderes. Este é o entendimento do TJMG, corroborado pelo STF, em situação similar que versa sobre lei deste Município, in verbis: “RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.077.116 MINAS GERAIS - RELATOR :MIN. MARCO AURÉLIO - RECTE.(S) :MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA - ADV.(A/S) :WEDERSON ADVINCULA SIQUEIRA ADV.(A/S) :MARCOS EZEQUIEL DE MOURA LIMA - RECDO.(A/S) :PROCURADORIA DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - DECISÃO - RECURSO EXTRAORDINÁRIO - LEI MUNICIPAL - INICIATIVA - SEPARAÇÃO DOS PODERES - PRECEDENTES - AGRAVO DESPROVIDO. 1. O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais julgou procedente pedido formalizado em processo objetivo, assentando inconstitucional a Lei nº 12.530, de 19 de abril de 2002, com a redação dada pelas Leis nº 12.698, de 21 de novembro de 2012, e nº 12.755, de 15 de janeiro de 2013, do Município de Juiz de Fora/MG, de iniciativa parlamentar, ante fundamentos assim resumidos: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO PRESENTE. LEI MUNICIPAL. REGULARIZAÇÃO DE CONSTRUÇÕES, REFORMAS, MODIFICAÇÕES OU AMPLIAÇÕES DE EDIFICAÇÕES. COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO. VÍCIO DE INICIATIVA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. INCONSTITUCIONALIDADE PRESENTE. 1. A possibilidade jurídica da pretensão é aspecto puramente processual e consiste na existência abstrata de previsão do tipo de tutela jurisdicional pretendida ordenamento jurídico. 2. Compete ao município legislar sobre planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, conforme preveem os artigos 170 e 171 da Constituição do Estado de Minas Gerais. 3. Incide em inconstitucionalidade a lei, resultante de iniciativa do Poder Legislativo, que dispõe sobre a regularização de construções, reformas, modificações ou ampliações de edificações, porque trata de matéria cuja iniciativa compete privativamente ao chefe do Poder Executivo. Assim, houve afronta ao princípio constitucional da separação dos poderes. 4. Pretensão inicial da ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. (…) 2. Há reiterados pronunciamentos do Supremo no sentido do reconhecimento da competência privativa do Chefe do Executivo para legislar sobre a criação, estruturação e, como na situação em jogo, atribuições das secretarias e órgãos da Administração Pública - artigo 61, § 1º, inciso II, alínea “a”, da Constituição Federal -, presente o princípio da separação dos poderes - artigo 2º da Lei Maior. Precedentes: ação direta de inconstitucionalidade nº 2.329, relatora ministra Cármen Lúcia, Pleno, acórdão publicado no Diário da Justiça de 25 de junho de 2010; agravo regimental no recurso extraordinário nº 653.041, relator ministro Edson Fachin, Primeira Turma, acórdão publicado no Diário da Justiça de 9 de agosto de 2016. Confiram a ementa da decisão formalizada nesse último processo: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. VÍCIO DE INICIATIVA. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR QUE DISPÕE SOBRE ATRIBUIÇÕES E ESTABELECE OBRIGAÇÃO A ÓRGÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Acórdão recorrido que se encontra em sintonia com a jurisprudência desta Corte no sentido de que padece de inconstitucionalidade formal a lei de iniciativa parlamentar que disponha sobre atribuições ou estabeleça obrigações a órgãos públicos, matéria da competência privativa do Chefe do Poder Executivo. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. 3. Ante os precedentes, conheço do agravo e o desprovejo.” Vê-se que o Projeto de Lei Complementar nº 15/2019, que altera a Lei Complementar nº 62/17, versa sobre matéria que é de competência do Órgão de Planejamento Municipal - SEPUR conforme art. 28-A da Lei Municipal nº 13.830/2019, com redação dada pela Lei Municipal nº 14.159/2021, art. 171 da Lei Complementar nº 82/2018 e arts. 4º e seguintes da Resolução nº 178/2021, portanto, do Poder Executivo. Neste contexto, a autoria da Casa Legislativa inquina de inconstitucionalidade formal o Projeto de Lei Complementar por afronta ao artigo 61, § 1º, inciso II, alínea “a”, da Constituição Federal. Além disso, verifica-se que o processo legislativo é nulo de pleno direito, já que falta requisito inafastável - qual seja, a aprovação prévia pelo COMPUR, nos termos do estabelecido pelo PDP - Lei Complementar nº 82/2018, já em vigor, in verbis: “Art. 185. São ainda competências específicas do COMPUR relativas à operacionalização de medidas vinculadas às normas e instrumentos urbanísticos: (...) II - deliberar, a partir de parecer analítico dos órgãos técnicos, sobre toda proposta de: (...) b) formulação ou revisão da legislação urbanística do Município de Juiz de Fora, em especial, as decorrentes do Plano Diretor Participativo de Juiz de Fora;” Assim, a nulidade por vício no processo macula, igualmente, o Projeto de Lei Complementar em comento de inconstitucionalidade ante a Lei Orgânica do Município. Da leitura da proposição, verifica-se que está se alterando o uso do solo sem que tenha havido sua análise prévia pelo COMPUR, nos termos do dispositivo retrocitado. Conforme o exposto, do ponto de vista jurídico, o Projeto de Lei Complementar nº 15/2019, tal qual aprovado pela Câmara, padece de inconstitucionalidade formal e nulidade por vício no processo legislativo, o que recomenda seu veto. Não bastassem todas as razões acima, relacionadas ao processo legislativo, quanto ao mérito, a análise técnica da SEPUR, abaixo transcrita, revela a inadequação do conteúdo do Projeto de Lei Complementar, bem como a ausência de interesse público no mesmo: “O zoneamento urbano foi concebido como disposto na Lei 6.910/86, composto de quatro zonas: Residencial, Comercial, Industrial, e Uso Múltiplo (art. 6º). A residencial se subdivide em ZR1, ZR2 e ZR3 e as Atividades foram agrupadas em Categorias, sendo que a Comercial e de Prestação de Serviços ficaram subdivididas em Local, Bairro, Principal e Setorial, constando do Anexo 7 suas atividades nas subclasses. Por isso que a atividade proposta "imobiliárias administradoras de imóveis e congêneres" deveria ser, se fosse o caso, inserida/redistribuída entre as subclasses do Anexo 7 e não diretamente em um zoneamento (ZR2, ZR3). A não observância desta regra implica na descaracterização do zoneamento, gerando uma complexidade desnecessária na análise e aplicação da legislação urbana, prejudicial aos particulares e poder público. Nítida é a razão porque mudanças na legislação urbanística reclama prévios e aprofundados estudos técnicos. Por sua vez, o cumprimento do disposto no art. 49, inc. III da Lei 6.910/86 tem especial importância, posto que questões dessa ordem receberiam por ocasião do parecer do Conselho Municipal de Política Urbana a contribuição não só do órgão de planejamento, mas dos demais setores técnicos integrantes do COMPUR. O ordenamento da cidade é função típica do poder público e deve ser exercida em prol da coletividade o que, no presente caso, aponta para a inadequação da proposta de lei, uma vez que não conferiu meios de se aferir, no geral ou no caso concreto, a adequação da atividade pretendida nos diversos locais em que a autoriza e, da mesma forma, não definiu qual o seu porte máximo, providências estas que possibilitariam sua aplicação mesmo que descaracterizando a regra do zoneamento municipal. Assim, com o fim de observar as regras legais e possibilitar que as alterações da legislação surtam efeitos positivos para todos o veto ao PLEIC se mostra pertinente.” Pelas razões jurídicas e técnicas acima transcritas, o veto ao presente Projeto de Lei Complementar é medida que se impõe.

Prefeitura de Juiz de Fora, 21 de julho de 2021.

a) MARGARIDA SALOMÃO - Prefeita de Juiz de Fora.



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