Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Proposição: PLEI - Projeto de Lei
Número: 6/2019  -  Processo: 8327-00 2019

MARCELO PERES GUERSON - DIRETORIA JURÍDICA

PARECER Nº: 08/2019.

PROCESSO Nº: 8.327/2019.

PROJETO DE LEI Nº: 06/2019.

EMENTA: “Proíbe o manuseio, a utilização, a queima e a soltura de fogos de estampidos e de artifícios, assim como de quaisquer artefatos pirotécnicos de efeito sonoro ruidoso no âmbito no Município de Juiz de Fora e dá outras providências.”.

AUTORIA: Vereador Marlon Siqueira.

 

RELATÓRIO

Solicita-nos o ilustre Vereador Zé Márcio, membro da Comissão de Legislação, Justiça e Redação desta Casa, análise jurídica acerca da constitucionalidade e da legalidade do Projeto de Lei nº 06/2019, que: “Proíbe o manuseio, a utilização, a queima e a soltura de fogos de estampidos e de artifícios, assim como de quaisquer artefatos pirotécnicos de efeito sonoro ruidoso no âmbito no Município de Juiz de Fora e dá outras providências”.

É o breve relatório. Passo a opinar.

 

FUNDAMENTAÇÃO

No que concerne à competência municipal sobre a matéria em questão, não há qualquer impedimento, visto que a Constituição Federal e Estadual dispõem sobre normas que autorizam os Municípios a legislarem sobre assuntos de interesse local. Senão vejamos:

Constituição Federal:

“Art. 30 - Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

Constituição Estadual:

“Art. 171 – Ao Município compete legislar:

I – sobre assuntos de interesse local, notadamente:

Por interesse local entende-se:

“todos os assuntos do Município, mesmo em que ele não fosse o único interessado, desde que seja o principal. É a sua predominância; tudo que repercute direta e imediatamente na vida municipal é de interesse local”. (CASTRO José Nilo de, in Direito Municipal Positivo, 4. ed., Editora Del Rey, Belo Horizonte, 1999, p. 49).

Ademais, acrescente–se, o poder de polícia administrativa, que se manifesta tanto através de atos normativos e de alcance geral quanto de atos concretos e específicos, aptos a condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade.

A argumentação encontra respaldo no magistério do ilustre doutrinador Diógenes Gasparini, que nos ensina:

“O fundamento da atribuição de polícia administrativa está centrado num vínculo geral, existente entre a Administração Pública e os administrados, que autoriza o condicionamento do uso, gozo e disposição da propriedade e do exercício da liberdade em benefício do interesse público ou social. Alguns autores chamam-no de supremacia geral da Administração Pública em relação aos administrados. Assim, o exercício da liberdade e o uso, gozo e disposição da propriedade estão sob égide dessa supremacia, e por essa razão podem ser condicionados ao bem-estar público ou social”.

O poder de polícia é inerente a toda Administração Pública e se reparte entre as esferas administrativas da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Todavia, segundo a técnica de repartição de competências adotada pela Constituição de 1988, há competências que são deferidas com exclusividade a determinada unidade federativa, enquanto outras são exercidas concorrentemente.Como adverte Hely Lopes Meirelles:

"Em princípio tem competência para policiar a entidade que dispõe do poder de regular a matéria. Assim sendo, os assuntos de interesse nacional ficam sujeitos à regulamentação e policiamento da União; as matérias de interesse regional sujeitam-se às normas e à polícia estadual; e os assuntos de interesse local subordinam-se aos regulamentos edilícios e ao policiamento administrativo municipal. Todavia, como certas atividades interessam simultaneamente às três entidades estatais, pela sua extensão a todo o território nacional (v. g. saúde pública, trânsito, transportes, etc.), o poder de regular e de policiar se difunde entre todas as Administrações interessadas, provendo cada qual nos limites de sua competência territorial. A regra, entretanto, é a exclusividade do policiamento administrativo; a exceção é a concorrência desse policiamento." (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 16ª edição).

Neste sentido a lição do professor Celso Antônio Bandeira de Mello:

"A polícia administrativa manifesta-se tanto através de atos normativos e de alcance geral quanto de atos concretos e específicos. Regulamentos ou portarias – como as que regulam o uso de fogos de artifício...`` (Curso de Direito Administrativo, 13ª ed., Ed. Malheiros, págs. 695/696).

Mais uma vez o Mestre Hely Lopes Meirelles, em sua obra “Direito Municipal Brasileiro”, Editora Malheiros, demonstra que a Administração Pública pode e deve restringir determinados atos individuais em prol da coletividade, e não, proibir:

“O que a doutrina assinala uniformemente é a faculdade que tem a Administração Pública de ditar e executar medidas restritivas do direito individual em benefício do bem-estar da coletividade e da preservação do próprio Estado. Esse poder é inerente a toda Administração e se reparte entre todas as esferas administrativas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”

Toda essa conceituação doutrinária já foi absorvida pela nossa Legislação, valendo citar o art. 78 do Código Tributário Nacional (Lei 5.172/66):

“Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.”

Portanto, conforme se verifica, o Município, usando do seu poder de polícia e na defesa dos interesses da coletividade e do bem-estar social, pode regular a matéria, repita-se, inclusive por ser de interesse local, porém, sem ferir os direitos constitucionais do cidadão. Diante desta colocação, verifica-se que quando há possibilidade da Administração limitar o exercício de direitos individuais, presume-se que este seja feito através de lei. Portanto, a proposição sob comento enquadra-se no poder supramencionado, respeitando o princípio da legalidade.

A polícia administrativa de maneira preferencialmente preventiva age através de ordens e proibições, conforme o objetivo desse projeto de lei, que visa sanções caso seja descumprido a ordem.

Assim, a função legislativa da Câmara Municipal estende-se, via de regra, a todos os assuntos e matérias de competência do município, como é o caso do Código de Posturas do Município de Juiz de Fora (Lei nº 11.197, de 03 de agosto de 2006), prevê:

“Art. 1º Esta Lei institui o Código de Posturas do Município, definindo as condições necessárias para a promoção do bem-estar e da qualidade de vida no ambiente municipal por meio do ordenamento dos comportamentos, das condutas e dos procedimentos dos cidadãos em Juiz de Fora, devendo o Executivo exercer o seu poder de polícia para garantir a aplicabilidade desta Lei.

(...)

§ 2º Considera-se o exercício do poder de polícia, para efeito desta Lei, o somatório das atividades administrativas gerais e abstratas, ou concretas, específicas do Poder Executivo.

“Art. 3º Esta Lei ampara o cidadão, em suas diversas manifestações, priorizando os fatores geradores de qualidade de vida, de comodidade, de mobilidade, de higiene, de saúde pública, de habitabilidade, de segurança, de moralidade, de aperfeiçoamento pessoal e social, de desenvolvimento da produção e utilização do modo de produzir e consumir bens culturais, econômicos e sociais, sem detrimento das demais atividades e interesses públicos.”

Art. 5º Para assegurar o disposto neste título, nos padrões definidos por esta Lei, o Poder Executivo atuará e fiscalizará, segundo critérios definidos, no que segue:

g) fiscalização, procedimentos e penalidades, dispondo sobre advertência ou penalidade alternativa, multa, apreensão dos bens e sua destinação, suspensão e cassação de licença e revogação de autorização, embargo de obra ou construção, interdição e procedimentos de aplicação de penalidades;

Portanto, conforme se verifica, o município, usando do seu poder de polícia e na defesa dos interesses da coletividade e do bem-estar social, pode regular a matéria.

Quanto à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, verifica-se que não há vício, eis que não se trata de matéria de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo que estão elencadas no art. 36 da Lei Orgânica Municipal, sendo, portanto, de iniciativa concorrente.

Sob o tema, pronunciou-se o Tribunal de Justiça de São Paulo, senão vejamos:

Órgão Especial deste E. Tribunal de Justiça, em julgamento realizadoem 01.08.2018 (ADI nº 2029897-15.2018.8.26.0000), reconheceu a constitucionalidade da Lei Municipal nº 11.634/17: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Lei nº 11.634, de 12.12.17, do Município de Sorocaba, dispondo sobre "ruídos sonoros provenientes da queima e soltura de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos". Proibição de utilização de fogos que causem estouros e estampidos acima de 65 (sessenta e cinco) decibels nas áreas públicas da cidade. Competência legislativa. Norma versando sobre o controle de poluição sonora. Competência concorrente em matéria ambiental e de saúde pública. Devidamente observados os dois requisitos fixados pelo Eg. STF para a atuação legislativa do Município em questões ambientais (Tema nº 145): (i) o interesse local e (ii) a harmonia entre a lei municipal e as regras editadas pelos demais entes federativos, notadamente a Lei nº 6.938/81 e as Resoluções CONAMA nº 01/90 e 02/90. Inexistência do vício apontado na exordial. Recente precedente deste Eg. Órgão sobre questão idêntica. Separação dos poderes. Inocorrência de afronta, seja sob a ótica do vício de iniciativa, seja por intromissão do Legislativo na seara administrativa. Regulamentação do ruído máximo dos fogos de artifício não caracteriza ingerência em atos de gestão. Não evidenciada ofensa ao princípio constitucional da 'reserva de administração' e separação dos poderes. Inexiste o vício apontado. Fonte de custeio. Possível a indicação de fonte de custeio genérica (art. 5º). Precedentes dos Tribunais Superiores. Ação improcedente. (Direta de Inconstitucionalidade 2029897-15.2018.8.26.0000; Rel. Des. Evaristo dos Santos; Órgão Especial; j. 01/08/2018) Conforme o entendimento do C. Órgão Especial no julgado acima transcrito, a Lei nº 11.634/17 apenas se limitou a regulamentar o limite máximo dos ruídos sonoros decorrentes do uso dos fogos de artifício, de forma a controlar a poluição sonora na cidade, o que enseja a conclusão de que a norma impugnada não versa sobre produção e consumo e nem tampouco sobre material bélico, mas sim sobre direito ambiental. A respeito do tema, o C. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 586224 (Tema 145), fixou a seguinte tese: “o município é competente para legislar sobre o meio ambiente com a União e Estado, no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, inciso VI, c/c 30, incisos I e II, da Constituição Federal)”. No caso dos autos, foram cumpridos os dois os requisitos autorizadores da competência legislativa do Município: interesse local e harmonia entre a lei municipal e as regras editadas pelos demais entes federativos. O interesse local para regulamentar o volume máximo de ruído de fogos de artifício permitido no Município é evidente e, conforme bem destacado pelo voto do E. Des. Relator Evaristo dos Santos, “é notório que a Lei Municipal nº 11.634/17, ao acolher as recomendações da NBR 10.151 e NBR 10.152 para classificação da poluição sonora, seguiu exatamente as diretrizes traçadas pela Resolução CONAMA nº 01/90, sendo plenamente harmônica, pois, com o regramento federal”. Desta forma, diante do reconhecimento da constitucionalidade da Lei nº 11.634/2017 pelo C. Órgão Especial deste tribunal, deve ser mantida a sentença que denegou a segurança. Pelo exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso. Eventuais recursos interpostos contra este julgado estarão sujeitos a julgamento virtual, devendo ser manifestada a discordância quanto a essa forma de julgamento no momento da interposição. Desembargadora: Maria Laura de Assis Moura Tavares. Relatora.

Seguindo esta premissa, indubitavelmente insere–se no âmbito de interesse direto da cidade e de seus habitantes a presente matéria, indiscutível, portanto, a competência do Município.

CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, sem adentrarmos no mérito da proposição, arrimados nas disposições constitucionais, legais, doutrinárias e jurisprudenciais apresentadas, concluímos que o projeto de lei é CONSTITUCIONAL e LEGAL.

Cumpre esclarecer que todo o exposto trata-se de um parecer opinativo, ou seja, tem caráter técnico-opinativo. O renomado doutrinador HELY LOPES MEIRELLES, em sua incontestável obra Direito Administrativo Brasileiro, Editora Malheiros, ensina:

“O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subseqüente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação por quem o solicitou.”

É o nosso parecer, s.m.j., o qual submetemos, sub censura, à consideração da digna Comissão de Legislação, Justiça e Redação desta Casa.

Palácio Barbosa Lima, 18 de janeiro de 2019.

Marcelo Peres Guerson

Assessor Técnico

 

Aprovo a manifestação acima, dando-lhe força de parecer opinativo.



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