![]() |
CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA |
Proposição: | MSGEX - Mensagem do Executivo Número: 3361/2003 - Processo: 4340-02 2003 |
|
|
PARECER Nº232/2003 | |
Parecer nº232/2003 Em 08/12/2003
Destinatário: Exmo. Sr. Vereador Eduardo de Freitas.
Referências:
1. Processo nº4340/2003 2ºv. 2. Mensagem nº3361 que traz projeto de lei que dispõe sobre Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza - ISSQN no Município de Juiz de Fora. 3. Autor da proposição - Exmo. Sr. Prefeito Municipal Raimundo Tarcísio Delgado.
Trata-se de pedido de parecer pertinente à análise da constitucionalidade e legalidade da proposição acima identificada.
É a síntese do necessário. Passo a opinar.
A matéria em tela está albergada, s.m.j., no conceito de interesse local, definido magistralmente por Celso Ribeiro Bastos, in Curso de Direito Constitucional, 1989, p.277:
“Cairá, pois, na competência municipal tudo aquilo que for de seu interesse local. É evidente que não se trata de um interesse exclusivo, visto que qualquer matéria que afete uma dada comuna findará de qualquer maneira, mais ou menos direta, por repercutir nos interesses da comunidade nacional. Interesse exclusivamente municipal é inconcebível, inclusive por razões de ordem lógica: sendo o Município parte de uma coletividade maior, o benefício trazido a uma parte do todo acresce a este próprio todo. Os interesses locais dos Municípios são os que entendem imediatamente com as suas necessidades imediatas, e, indiretamente, em maior ou menor repercussão, com necessidades gerais.”
Neste acorde e com escólio na autoridade de Celso Ribeiro Bastos, não vislumbro vício no que cinge a atuação legislativa municipal, consoante preceito insculpido no dispositivo do art.30, I c.c. art.156, III da CRFB/88 e art.170, III da CEMG/99:
Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; ... Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: ... III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar. CRFB/88
Art.170. A autonomia do Município se configura no exercício de competência privativa, especialmente: ... III - instituição, decretação e arrecadação de tributos de sua competência e aplicação de suas rendas, sem prejuízo da obrigação de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei; CEMG/89
No concernente à iniciativa, o dispositivo do art.70 da Lei Orgânica Municipal não veda que proposições deste jaez tenham o seu nascedouro, quer no Poder Executivo, quer no Poder Legislativo, o que faz legítimo o início do processo legislativo, dentro da linha defendida pelo Supremo Tribunal Federal, veja:
“A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que - por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo - deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca. - O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara - especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo - ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado.” (STF - ADIMC 724 - TP - Rel. Min. Celso de Mello - DJU 27.04.2001 - p. 00056)
Portanto, sem maiores divagações, parece-me legítimo o início do processo legislativo, não havendo vício em seu impulso originário.
Sem análise do mérito da proposição em comento, conforme requerido pelo Ilustre Presidente da Comissão de Legislação, Justiça e Redação, passaremos a análise de seus aspectos técnicos.
No que cinge ao aspecto temporal e legal, entendo que respeitados os Princípios da Reserva Legal e da Anterioridade, mormente se se considerar que a proposição, caso aprovada, entrará em vigor em 1º de janeiro de 2004, atendendo-se ao disposto no preceito do art.150, I, III, 'a', 'b' da CRFB/88:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; ... III - cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado; b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
No mesmo sentido é o magistério de Roque Antônio Carrazza em Curso de Direito Tributário, p.166 e 211:
“Mas, que pretende significar a precitada norma constitucional? Simplesmente, que a lei que cria ou aumenta um tributo - está é a regra geral - ao entrar em vigor, fica com sua eficácia paralisada até o início do próximo exercício financeiro, quando, aí, sim, incidirá, ou seja, passará a produzir todos os efeitos, na ordem jurídica. .... Resulta claro da leitura do texto constitucional - em benefício da segurança do cidadão e terceiros submetidos à ordenação estatal - que só o Legislativo pode emanar normas genéricas e abstratas contendo preceitos vinculantes. Por outro lado, a tessitura informativa do processo de formação das leis garante não só ampla discussão dos projetos, com sua conseqüente publicidade, como possibilidade de colaboração, crítica, advertência e organização de movimentos de esclarecimento ou mesmo pressão sobre os legisladores.”
Dando seguimento a análise, noto que o projeto de lei pretende adequar a legislação tributária municipal às novas diretrizes inseridas pela lei complementar nº116/2003, esta com seu fundamento de validade na própria Constituição de 1988, ex vi art.156, III, in fine.
Com a promulgação da Lei Complementar n°116/03, consolida-se parte da legislação concernente ao ISSQN até então vigente, mantendo alguns institutos inicialmente tratados pelo Decreto-Lei n°406/68, porém, acrescentando outros, mormente por inserir novos serviços a lista anterior.
Desta feita, a lei complementar estabelece os contornos da atividade tributária municipal no que cinge a incidência de ISS, ou seja, quais serão os serviços sujeitos ao ISS, o que, s.m.j., vincularia o município à tributação de somente aqueles contidos na lei complementar, ex vi art.156, III, parte final da Carta de 1988, conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça em casos análogos, veja:
TRIBUTÁRIO - ISS - INCIDÊNCIA - LISTA DE SERVIÇOS BANCÁRIOS ANEXA AO DECRETO-LEI Nº 406/68 - ANALOGIA - IMPOSSIBLIDADE - SERVIÇOS DE ASSESSORIA, EXPEDIENTE, CONTROLE E PROCESSAMENTO DE DADOS - NÃO INCIDÊNCIA - PRECEDENTES - 1. A lista de serviços bancários que acompanha o Decreto-Lei nº 406/68, com as alterações do Decreto-Lei nº 834/69 é exaustiva e não exemplificativa, não admitindo a analogia, objetivando alcançar hipóteses de incidência diversas das ali consignadas. 2. "Os serviços de datilografia, estenografia, secretaria, expediente etc. Prestados pelos bancos não possuem caráter autônomo, pois inserem-se no elenco das operações bancarias originárias, executadas, de forma acessória, no propósito de viabilizar o desempenho das atividades-fim inerentes as instituições financeiras". 3. Agravo regimental provido, para conhecer do agravo de instrumento e negar seguimento ao Recurso Especial (art. 544, § 3º, c/c art. 557, caput, do CPC). (STJ - AGA 461727 - MG - Rel. Min. Luiz Fux - DJU 04.08.2003 - p. 00233)JCPC.544 JCPC.544.3 JCPC.557
TRIBUTÁRIO - ISS - SERVIÇOS DE MONOBRA E DE REMOÇÃO - NULIDADE DA CDA - OCORRÊNCIA - 1. A lista de serviços é "números clausus inadmitindo interpretação por analogia, como fez o Município para cobrar o ISS da recorrente, em flagrante violação ao princípio da legalidade tributária. 2. Recurso Especial conhecido e provido por maioria. (STJ - RESP 401698 - ES - 2ª T. - Rel. p/o Ac. Min. Francisco Peçanha Martins - DJU 09.06.2003 - p. 00213)
Logo, entendo indevida a inserção do item 41.01 do art.1º e ao art.47 e, por conseguinte, a ampliação dos serviços por não estar em consonância, quer com a Carta Política, quer com a lei complementar nº116/03, no esteio dos arestos suso transcritos.
Dando seguimento a análise, observa-se que no art.7º são inseridas normas isentivas, o que faria imperativo o atendimento ao dispositivo do art.14 da lei complementar nº101/00, veja:
Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do artigo 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição. § 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.
Destarte, a concessão do benefício fiscal deveria estar acompanhada de impacto orçamentário-financeiro e das medidas de compensação de receitas ou de demonstração de que a renúncia foi considerada na ocasião da elaboração do orçamento, exigências estas não cumpridas pelo Poder Executivo.
Outro ponto de tensão observado na proposição pertine ao dispositivo do art.46, onde se institui tratamento diferenciado entre profissionais autônomos com grau de instrução superior ou equiparados e os demais, o que, a meu juízo, já atritaria com o Princípio Constitucional da Isonomia previsto no dispositivo do art.150, II do Texto Fundamental:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: ... II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
Além de não se fixar uma alíquota determinada nas hipóteses de incidência articuladas, o Poder Executivo inseriu termos imprecisos e vagos que não permitem se aferir objetivamente qual a fórmula cálculo utilizada para se atingir o valor do imposto.
Oportuno ponderar que a matéria inserta no projeto de lei encontra-se disposta no bojo do Código Tributário Municipal. Em sendo aprovada seria aquele substancialmente alterado, principalmente do art.75 usque 120, o que faz imperativo a observância das disposições constantes do art.12 da lei complementar nº95/98, veja:
Art. 12. A alteração da lei será feita: I - mediante reprodução integral em novo texto, quando se tratar de alteração considerável;
A reprodução de novo texto legal encontra agasalho dentro da técnica legislativa apropriada à espécie.
Por fim, registro que a exigüidade de tempo não permitiu ao procurador signatário deste parecer aprofundar na análise da matéria que demandaria maior tempo de reflexão e de colaboração coordenada com outros segmentos técnicos, notadamente o contábil.
Face ao exposto, conclui-se que o Município de Juiz de Fora possui competência para legislar sobre toda a matéria constante do Projeto de Lei, não havendo, pois, vício subjetivo de iniciativa. Entretanto, existem alguns pontos de tensão nos moldes acima articulados que impedem a aprovação da matéria da forma como se encontra, ficando ao alvedrio dessa Comissão ponderar sobre a necessidade de temperamentos nas considerações aqui tecidas.
Reitero o propósito de realizar quaisquer explicações complementares que eventualmente se façam necessárias.
É o parecer.
Roberto Thomaz da Silva Filho. Procurador I
|