PARECER N°: 159/2014
PROCESSO N°: 2713/99
PROJETO DE
LEI COMPLEMENTAR Nº: 013/2014
EMENTA: “DISPÕE SOBRE A OBRIGATORIEDADE DO ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA - EIV E DO RELATÓRIO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA - RIVI ATENDENDO O DISPOSTO NO ARTS. 36 E 37 DO ESTATUTO DAS CIDADES.”
AUTORIA: VEREADOR JÚLIO GASPARETTE
INDEXAÇÃO: ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA ORBRIGATORIEDADE - ATENDIMENTO AO ESTATUTO DAS CIDADES - ADOÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR – LEGALIDADE E CONSTITUCIONALIDADE, UMA VEZ OBSERVADA A RESSALVA EXISTENTE.
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Solicita-nos o Ilustre Vereador Luiz Otávio Fernandes Coelho, Presidente da Comissão de Legislação, Justiça e Redação, parecer a respeito do Projeto de Lei Complementar nº 105/2013, de autoria do Nobre Vereador Júlio Gasparette, que “DISPÕE SOBRE A OBRIGATORIEDADE DO ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA - EIV E DO RELATÓRIO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA - RIVI ATENDENDO O DISPOSTO NO ARTS. 36 E 37 DO ESTATUTO DAS CIDADES.”
O Nobre Edil apresenta a seguinte justificativa:
“A Lei Federal n° 1 0.257/2001, conhecida como Estatuto das Cidades, prevê em seu art. 36 que:
"Lei Municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público Municipal".
O art. 37 do referido diploma dispõe sobre as questões mínimas a serem analisadas de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades.
Em Juiz de Fora, existe a Lei n° 12.124/2010 que dispõe sobre o assunto.
No entanto, esta Lei foi aprovada nesta casa com quorum e rito de Legislação Ordinária.
Todavia, como especificado no art. 35 da Lei Orgânica do Município de Juiz de Fora, essa matéria deve ser tratada através de Lei Complementar, sob pena de inconstitucionalidade.
Portanto, o presente Projeto de Lei Complementar vem corrigir este equívoco na Legislação Municipal, implantando a obrigatoriedade de determinados empreendimentos ou atividades se submeterem à elaboração de Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV).
É o breve relatório.
Passo a opinar.
No que concerne à competência legislativa, não há qualquer impedimento, visto que a Constituição Federal e a Constituição Estadual dispõem sobre normas que autorizam os Municípios a legislarem sobre assuntos de interesse local. Senão vejamos:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 30 - Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
CONSTITUIÇÃO ESTADUAL
Art. 171 - Ao Município compete legislar:
I - sobre assuntos de interesse local, notadamente:
No entendimento deste Procurador, interesse local é todo e qualquer assunto de origem do Município, considerado primordial, essencial e que de forma primaz atinge direta ou indiretamente a vida do Município e de seus munícipes.
Cabe registrar ainda que, com a Constituição Federal de 1988 o Município atingiu um grau de importância impensável nos sistemas constitucionais anteriores. Não há dúvida de que ao Município foi atribuída uma ampla competência legislativa.
A forma de definição da competência do Município foi diversa da utilizada para prever as competências dos Estados e da União. Enquanto para Estados e União foram definidas as matérias a serem objeto de legislação, para os Municípios foi prevista uma competência genérica para "legislar sobre assuntos de interesse local" e "suplementar a legislação federal e a estadual no que couber".
Interesse local é um conceito complexo, que só pode ser definido tendo em vista a situação concreta, pois para cada local se terá um rol diferente de assuntos assim classificados.
Nos ensinamentos de nossos indiscutíveis doutrinadores administrativistas, podemos destacar dentre eles, o seguinte:
HELY LOPES MEIRELLES, in, Direito Municipal Brasileiro, Editora Malheiros:
“O assunto de interesse local se caracteriza pela predominância (e não pela exclusividade) do interesse para o Município, mas aquele que predominantemente afeta à população do lugar. em relação ao do Estado e da União. Isso porque não há assunto municipal que não seja reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferença é apenas de grau, e não de substância. Exemplos típicos dessa categoria são o trânsito e a saúde pública, sobre os quais dispõem União (regras gerais: Código Nacional de Trânsito, Código Nacional de Saúde Pública), os Estados (regulamentação: Regulamento Geral de Trânsito, Código Sanitário Estadual) e o Município (serviços locais: estacionamento, circulação, sinalização, etc; regulamentos sanitários municipais".
Portanto, não há óbice quanto à competência, já que a matéria é de interesse local.
Quanto à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, também não vislumbramos nenhum vício no presente Projeto de Lei, devendo-se buscar amparo na Lei Orgânica do Município. Desta forma, pode-se verificar, que o objeto da proposição sob análise não se enquadra dentre as elencadas no artigo 36 da referida Lei, que trata das matérias de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo Municipal, já que a matéria em pauta classifica-se como de iniciativa concorrente.
O Mestre Hely Lopes Meirelles, em sua obra Direito Municipal Brasileiro, Malheiros Editores, esclarece:
“Com efeito, a apresentação de projeto de lei versando sobre essa matéria é de competência concorrente, visto não estar reservada privativamente ao Poder Executivo, nada obstante, pois, a iniciativa de um vereador, como no caso aqui examinado. Não houve, portanto, invasão da esfera de atribuições do Executivo municipal, já que a função da Câmara Municipal, conforme ensinamento do saudoso Hely Lopes Meirelles estende-se a todos os assuntos da competência do Município, e mais: '...Leis de iniciativa da Câmara, ou mais propriamente, de seus vereadores, são todas a que a lei orgânica municipal não reserva, expressa e privativamente, á iniciativa do prefeito. As leis orgânicas devem reproduzir, dentre as matérias previstas nos arts. 61, §1º e 165 da CF, as que se inserem no âmbito da competência municipal. São, pois, de iniciativa exclusiva do prefeito, como Chefe do Executivo local, os projetos de lei que disponham sobre a criação, estruturação e atribuições das secretarias, órgãos e entes da Administração Pública municipal; criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta, autarquia e fundacional do Município; o regime jurídico único e previdenciário dos servidores municipais, fixação e aumento de sua remuneração; plano plurianual, as diretrizes orçamentárias, o orçamento anual e os critérios suplementares e especiais. Os demais projetos competem concorrentemente ao prefeito e à Câmara, na forma regimental.”.
Pois bem, sem queremos adentrar no mérito, é de bom alvitre que destaquemos alguns detalhes referentes à proposição em comento. Senão vejamos:
Apesar de estar em vigor a Lei Municipal n° 12.214/2010, cujo objeto é semelhante ao Projeto em questão, nota-se que o Projeto atual é mais abrangente no que diz respeito à obrigatoriedade de determinados empreendimentos ou atividades se submeterem à elaboração do Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV), razão pela qual em seu art. 10, revoga a antedita Lei n° 12.214/2010.
Destaca-se, também, que a proposição em comento está sendo apresentada corretamente na forma de “projeto de lei complementar” e não como “projeto de lei ordinária”, adequando, assim, ao que dispõe o art. 35, inciso VI, da Lei Orgânica Municipal, verbis:
Art.35. A lei complementar disporá, dentre outras matérias previstas nesta Lei Orgânica, sobre:
(...)
VI – parcelamento, ocupação e uso do solo.
E, para culminar, o projeto em tela, vem também atender às determinações contidas nos arts. 36 e 37 da Lei n° 10.257/2001 (Estatuto das Cidades), senão vejamos:
Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público Municipal.
Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes questões:
I – adensamento populacional;
II – equipamentos urbanos e comunitários;
III – uso e ocupação do solo;
IV – valorização imobiliária;
V – geração de tráfego e demanda por transporte público;
VI – ventilação e iluminação;
VII – paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.
Parágrafo único. Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV, que ficarão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público municipal, por qualquer interessado.
Finalmente, devemos fazer uma RESSALVA, a qual deverá ser observada pelo Autor. Trata-se dos arts. 7° e 9°, que geram obrigações à Secretaria de Governo, o que torna o projeto inviável quanto à sua aprovação com fincas na legalidade e constitucionalidade. Assim sendo, o Autor deverá rever os anteditos artigos, eliminando as obrigações geradas ao Executivo, ferindo, assim, o Art. 36 da Lei Orgânica Municipal, o qual a criação de obrigações ao Executivo, é matéria de iniciativa privativa do Prefeito.
Ex positis, e sem adentrarmos no mérito da proposição, sendo a matéria de competência municipal e não havendo vício de iniciativa, o projeto de lei poderá ser considerado legal e constitucional, desde que observada e atendida s RESSALVA acima.
Por derradeiro cumpre esclarecer que todo o exposto em nosso parecer ora ratificado, trata-se de um parecer opinativo, ou seja, tem caráter técnico-opinativo. O Prof. Hely Lopes Meirelles, em sua incontestável obra “Direito Administrativo Brasileiro”, Editora Malheiros, ensina:
“O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subseqüente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação por quem o solicitou.”
E para culminar com tal entendimento, o Supremo Tribunal Federal de forma específica, já expôs a sua posição a respeito, verbis:
“O parecer emitido por procurador ou advogado de órgão da administração pública não é ato administrativo. Nada mais é do que a opinião emitida pelo operador do direito, opinião técnico-jurídica, que orientará o administrador na tomada da decisão, na prática do ato administrativo, que se constitui na execução ex officio da lei. Na oportunidade do julgamento, porquanto envolvido na espécie simples parecer, ou seja, ato opinativo que poderia ser, ou não, considerado pelo administrador”.
(MANDADO DE SEGURANÇA N° 24.584-1 - DISTRITO FEDERAL - RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO DE MELLO – STF).
Este é o nosso parecer, que submetemos, sub censura, à Comissão de Legislação, Justiça e Redação.
Palácio Barbosa Lima, 24 de fevereiro de 2015.
Manoel Denezine Tavares
Procurador- I