Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Norma:    
Ocorrência: Ação Direta de Inconstitucionalidade - 24/03/2021 - Medida Cautelar - Parágrafo único do art. 1°

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – MEDIDA CAUTELAR - MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA – ARTIGO 1º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 14.021/2020 – LEI DE INICIATIVA DA MESA DIRETORA DA CÂMARA MUNICIPAL - RECOMPOSIÇÃO, A TÍTULO DE REVISÃO GERAL ANUAL, DOS VENCIMENTOS DOS SERVIDORES DA CÂMARA MUNICIPAL – EXTENSÃO DO PERCENTUAL AOS INATIVOS E PENSIONISTAS DO PODER LEGISLATIVO – POSSÍVEL INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO – MATÉRIA RELATIVA AO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA DO MUNICÍPIO – APARENTE VÍCIO DE INICIATIVA – POSSÍVEL VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA – FUMAÇA DO BOM DIREITO – PRESENÇA – REALIZAÇÃO DE PAGAMENTOS – PERIGO DE DEMORA – CAUTELAR DEFERIDA.
 
- O artigo 66, inciso III, alínea “c”, da Constituição do Estado, prevê que é de iniciativa privativa do Chefe do Executo a lei que dispõe sobre o regime de previdência dos servidores públicos da administração direta, autárquica e fundacional, cabendo destacar que cada ente público somente pode ter um regime próprio de previdência.

- Nesse contexto, a princípio, a Câmara Municipal não pode iniciar o processo legislativo para elaboração de lei que prevê a aplicação do percentual da revisão geral anual, concedida aos servidores em atividade do Poder Legislativo, aos benefícios previdenciários dos inativos e pensionistas do referido Poder.

- Como se não bastasse o possível vício de iniciativa, ao prever a revisão anual somente em relação aos inativos e pensionistas da Câmara Municipal, a norma, aparentemente, também viola o princípio da igualdade, desrespeitando o disposto no artigo 165, parágrafo 1º, da Constituição do Estado.

- O perigo de demora, no caso, decorre dos próprios efeitos da norma, pois haverá gasto de dinheiro público com pagamento aos inativos e pensionistas da Câmara Municipal, sem contar a aparente situação desigualdade criada entre os segurados do mesmo regime próprio de previdência.


Vistos etc., acorda, em Turma, o ÓRGÃO ESPECIAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DEFERIR A MEDIDA CAUTELAR.


DES. MOREIRA DINIZ
RELATOR
DES. MOREIRA DINIZ (RELATOR)
Cuida-se de ação direta de inconstitucionalidade promovida pelo Prefeito do Município de Juiz de Fora, com pedido de medida cautelar, na qual se objetiva a declaração de inconstitucionalidade do parágrafo único, do artigo 1º, da lei 14.021/20, do Município de Juiz de Fora.


O autor alega que a Mesa Diretora da Câmara Municipal de Juiz de Fora apresentou o projeto nº. 019/2020, que “dispõe sobre a recomposição de vencimentos e remunerações dos servidores efetivos e em comissão da Câmara Municipal de Juiz de Fora e dá outras providências”, concedendo, no artigo 1º, caput, recomposição salarial aos servidores efetivos e em comissão da Câmara Municipal de Juiz de Fora, em percentual equivalente ao índice do IPCA do período anual anterior, e estendendo tal recomposição aos inativos e pensionistas, no parágrafo único do referido dispositivo; que, todavia, o “Legislativo Municipal de Juiz de Fora não possui regime próprio de previdência”, “a remuneração dos servidores inativos e pensionistas do Legislativo Municipal, por isso, não tem como fonte o orçamento da Casa Legislativa” e “os servidores inativos e pensionistas do Legislativo Municipal, assim como os servidores inativos e pensionistas do Executivo Municipal, são vinculados o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) do Município de Juiz de Fora, custeado direta e exclusivamente pelo Executivo Municipal”; que “o Legislativo Municipal de Juiz de Fora não possui competência para apresentar um Projeto de Lei que vise acarretar ônus orçamentário do Executivo Municipal”; e que, em razão disso, vetou o parágrafo único, do artigo 1º, do projeto nº. 019/2020, mas o veto foi derrubado, sendo promulgada a lei 14.021/2020 com o referido dispositivo, que é inconstitucional, por violar a iniciativa legislativa privativa do Chefe do Executivo.

Ressalta que o vício de iniciativa se configura, porque o dispositivo altera a remuneração de servidores inativos e de pensionistas vinculados ao Executivo Municipal, via Regime Próprio de Previdência Social, com reflexos, inclusive na Lei Orçamentária e na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Defende que há um segundo vício de inconstitucionalidade no dispositivo impugnado, porque ele assegura recomposição somente a parte dos aposentados e pensionistas vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social, quais sejam, aqueles cujos cargos tiveram origem no Legislativo Municipal, ou seja, aplica revisão geral anual de forma distinta ou com índices distintos para certos aposentados e pensionistas, o que é constitucionalmente vedado.
Sustenta que a Constituição Estadual, nos artigos 24, caput e parágrafo 3º, 27, parágrafo 1º, e 90, incisos V e XI, “corrobora tanto a alegação de inconstitucionalidade formal, ao estabelecer que compete privativamente ao Governador apresentar Projetos de Lei que estabeleçam as diretrizes orçamentárias que aprove especificamente a concessão de vantagem ou o aumento de remuneração; quanto a de inconstitucionalidade material, ao impor que a revisão geral anual deve ser concedida a todos, sem distinção de índices; norma que, pelo princípio da simetria, é estendida do modelo estadual para o modelo municipal”. Alega, ainda, que a norma impugnada é inconstitucional, pois, “sendo competência exclusiva do Chefe do Executivo, a usurpação realizada pela Câmara Municipal viola a harmonia e a separação das funções dos Poderes, prevista no art. 173, §1º c/c art. 6º, ambos da Constituição do Estado de Minas Gerais”.
Afirma, também, que “a Lei Ordinária Municipal nº 14.021/2020, de iniciativa do Legislativo, em seu parágrafo único do artigo 1º, afronta a ordem constitucional e altera remuneração de servidores aposentados e pensionistas do Regime Próprio de Previdência Social sem a devida previsão orçamentária e/ou com o emprego diferenciado de índice de revisão geral anual para certos aposentados e pensionistas em relação aos demais, ferindo de morte os Princípios da Isonomia e da Impessoalidade”; que “além de reservar à iniciativa do Prefeito a iniciativa de projetos de lei que causem aumento de despesas sem indicação da fonte orçamentária na Lei de Diretrizes Orçamentárias (cuja iniciativa também é do Executivo), é a ele reservada a iniciativa daqueles projetos de lei que alterem a remuneração de servidores do Executivo e/ou que tratem de suas aposentadorias (in casu, a lei pretende beneficiar apenas uma parte dos aposentados e pensionistas)”; e que, além das inconstitucionalidades diretas, há ilegalidade que gera, também indiretamente, afronta à norma constitucional, pois “a Lei Municipal 14.021/2020 desrespeita frontalmente os artigos 17 e 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000, posto que acrescenta despesa obrigatória de caráter continuado aos cofres públicos, sem a atenção aos procedimentos regulares de demonstração de existência de receita (não há) e sem a demonstração da manutenção do respeito aos limites de gastos com pessoal (também não há)”.
Por fim, defende que os argumentos apresentados indicam a presença da fumaça do bom direito e que o perigode demora decorre do pagamento imediato aos aposentados epensionistas imposto pela norma, gerando prejuízo irreparável aos cofres públicos.
Pede a concessão de medida cautelar para suspender a aplicabilidade do parágrafo único, do artigo 1º, da lei 14.021/2020, e, ao final, pugna pela procedência da ação com adeclaração de inconstitucionalidade da referida norma.
A Câmara Municipal manifestou-se alegando a ausência de requisitos para a cautelar (documento 20).
A douta Procuradoria Geral manifestou-se pelo indeferimento da cautelar (documento 24).
A concessão da medida cautelar exige a presença da fumaça do bom direito e do perigo de mora.
 
No caso, tais requisitos se mostram presentes. O artigo 1º, caput, da lei 14.021/2020 do Município de Juiz de Fora, de iniciativa da Câmara Municipal, estabeleceu a recomposição, a título de revisão geral anual, a partir de 1º. de janeiro de 2020, dos vencimentos e remunerações dos servidores efetivos e em comissão da Câmara Municipal de Juiz de Fora, e dos valores das gratificações legislativas, na razão de 4,31%, correspondente à variação doÍndice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), no período compreendido entre 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2019.
O parágrafo único do referido artigo, que é objeto de questionamento na presente ação direta de inconstitucionalidade,
previu a extensão do referido percentual de revisão geral anual aos inativos e pensionistas da Câmara Municipal de Juiz de Fora.
Confira-se a integralidade da lei em questão:
“Art. 1º Ficam recompostos, a título de revisão geral anual, com base no inciso X do art. 37 da Constituição Federal, a partir de 1º de janeiro de 2020, os vencimentos e remunerações dos servidores efetivos e em comissão da Câmara Municipal de Juiz de Fora, e os valores das gratificações legislativas, no percentual de 4,31% (quatro vírgula e trinta e um por cento) correspondente à variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), no período compreendido entre 1º de janeiro a 31 dedezembro de 2019.
Parágrafo único. Fica estendido aos inativos e pensionistas da Câmara Municipal de Juiz de Fora o percentual de que trata o caput deste artigo.
Art. 2º. Vetado
Art. 3º As despesas com a execução desta Lei correrão à conta de dotações orçamentárias próprias da Câmara Municipal de Juiz de Fora. Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação,retroagindo seus efeitos financeiros a 1º de janeiro de 2020.
Paço da Prefeitura de Juiz de Fora, 17 de março de 2020.”
Não há dúvida de que é de iniciativa privativa da Mesa Diretora da Câmara Municipal a lei que dispõe sobre a revisão geral anual, prevista no artigo 37, X, da Constituição Federal, dos vencimentos dos servidores do Poder Legislativo local, porque cabe a cada Poder a iniciativa de lei dispondo sobre a fixação e alteração da remuneração de seus servidores.
Contudo, o caso envolve a extensão da revisão anual aos benefícios previdenciários dos inativos e pensionistas da Câmara Municipal.
Por força do disposto no artigo 40, parágrafo 20, da Constituição Federal, cada ente público somente pode contar com um regime próprio de previdência social, o que significa que os servidores dos Poderes Executivo e Legislativo do Município são submetidos ao mesmo regime próprio de previdência. É isso que ocorre no Município de Juiz de Fora, como se vê nas leis 11.036/2005 e 115/2020, que instruíram a inicial.
Nesse contexto, a questão que surge é se a Câmara Municipal pode iniciar o processo legislativo para elaboração de lei que trata da revisão anual dos benefícios previdenciários dos inativos e pensionistas que foram servidores do Poder Legislativo.
Numa primeira análise, a resposta é negativa, porque, segundo consta no artigo 66, inciso III, alínea “c”, da Constituição do Estado, a iniciativa de lei que trata do regime de previdência de cada ente público é do respectivo Chefe do Poder Executivo.
As matérias de iniciativa legislativa privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual, aplicável, em razão do princípio da simetria, ao Chefe do Poder Executivo Municipal, são aquelas elencadas no artigo 66, inciso III, da Constituição Estadual, que, por sua vez, segue o disposto no artigo 61, parágrafo 1º, da Constituição Federal, que trata dasmatérias de iniciativa privativa do Presidente da República.
Tendo em vista que há apenas um regime próprio de previdência em cada ente público e que cabe ao Chefe do Executivo a iniciativa de lei envolvendo o regime de previdência dosservidores públicos da administração direta, autárquica e fundacional, a conclusão a que se chega, a princípio, é que não tem a Câmara Municipal competência para iniciar um processo legislativo de elaboração de normaprevendo a revisão de benefício previdenciário, ainda que restrito aos ex- servidores do Poder Legislativo.
Vale destacar que a Constituição Federal tem um dispositivo específico (art. 40, §8º) assegurando o reajustamento dos benefícios previdenciários para preservar-lhes, em caráter permanente, ovalor real, conforme critérios estabelecidos em lei.
Ou seja, a revisão geral anual dos vencimentos dos servidores, prevista no artigo 37, inciso X, da Constituição Federal, não se confunde com o reajuste dos benefícios previdenciários para preservação do valor real, previsto no artigo 40, parágrafo 8º, da Constituição Federal.
Em relação à primeira, cada Poder teminiciativa legislativa privativa para tratar da revisão dos vencimentos de seus servidores, mas, em relação ao segundo, a iniciativa legislativa, numaprimeira análise, é privativa do Chefe do Poder Executivo.
Como se não bastasse o possível vício de iniciativa, ao prever a revisão anual somente em relação aos inativos e pensionistas da Câmara Municipal, a norma em questão, à primeira vista, também viola o princípio da igualdade, desrespeitando o disposto no artigo 165, parágrafo 1º, da Constituição do Estado, já que parte dos inativos e pensionistas não terão os benefícios revistos.
Assim, mostra-se presente a fumaça do bom direito.
Em relação ao perigo de demora, decorre dos próprios efeitos da norma, pois haverá gasto de dinheiro público com pagamento aos inativos e pensionistas da Câmara Municipal, sem contar a aparente situação desigualdade criada entre os segurados do mesmo regime próprio de previdência.
Ante o exposto, concedo a medida cautelar para suspender a eficácia do parágrafo único, do artigo 1º, da lei 14.021/2020, do Município de Juiz de Fora. Sem custas.

DES. PAULO CÉZAR DIAS - De acordo com o Relator.
DES. EDILSON OLÍMPIO FERNANDES - De acordo com o Relator.
DES. ARMANDO FREIRE - De acordo com o Relator.
DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA - De acordo com o Relator.
DES. TIAGO PINTO - De acordo com o Relator.
DES. JÚLIO CEZAR GUTTIERREZ - De acordo com o Relator.
DES. WANDERLEY PAIVA - De acordo com o Relator.
DES. AGOSTINHO GOMES DE AZEVEDO - De acordo com o Relator.
DES. NEWTON TEIXEIRA CARVALHO - De acordo com o Relator.
DES. CORRÊA JUNIOR - De acordo com o Relator.
DES. SÉRGIO ANDRÉ DA FONSECA XAVIER - De acordo com o
Relator.
DES. MAURÍCIO SOARES - De acordo com o Relato
DES. CARLOS ROBERTO DE FARIA - De acordo com o Relator.
DES. AMAURI PINTO FERREIRA - De acordo com o Relator.
DES. KILDARE CARVALHO - De acordo com o Relator.
DES. MÁRCIA MILANEZ - De acordo com o Relator.
DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL - De acordo com o Relator.
DES. WANDER MAROTTA - De acordo com o Relator.
DES. GERALDO AUGUSTO - De acordo com o Relator.
DES. CAETANO LEVI LOPES - De acordo com o Relator.
DES. BELIZÁRIO DE LACERDA - De acordo com o Relator.
DES. EDGARD PENNA AMORIM - De acordo com o Relator.
DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES - De acordo com o(a) Relator.
SÚMULA: DEFERIRAM A MEDIDA CAUTELAR


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