Brasão de Juiz de Fora CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA

Proposição: PLEI - Projeto de Lei
Número: 142/2019  -  Processo: 8491-00 2019

RAZÕES DE VETO

Não obstante reconhecer o mérito da iniciativa, vejo-me compelido a vetar o Projeto de Lei nº 142/2019, que “Dispõe sobre denominação de logradouro público”. O referido Projeto de Lei, objeto do presente veto, estabelece que passa a denominar-se, Rua José Luiz Ribeiro, a atual Rua projetada ao final da Rua Rubens Coimbra, no Bairro Sagrado Coração de Jesus. Passando-se aos motivos que ensejam o citado veto, inicialmente, cabe esclarecer que a denominação de logradouros e vias públicas é competência intrínseca do Município, já que se insere entre as medidas destinadas ao ordenamento urbano, nos termos do art. 182, da Constituição Federal.1 Observa-se que em recente decisão sobre o tema, reconhecido como de Repercussão Geral, o STF firmou a tese de que “É comum aos poderes Executivo (decreto) e Legislativo (lei formal) a competência destinada à denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações, cada qual no âmbito de suas atribuições” (RE 1151237 - data do julgamento 03/10/2019). Logo, impõe-se que os arts. 47, XIX e 26, XV da LOM sejam interpretados em conformidade com a tese supracitada, reconhecendo a competência comum entre os Poderes, com a possibilidade de denominação por lei ordinária e, também, por Decreto do Executivo. Observa-se que a LOM, ao estabelecer as competências da Câmara Municipal e do Executivo sobre o tema, contempla sistemática mais restritiva que o entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal ao vincular a denominação de logradouro público à prévia aprovação de lei em sentido estrito, in verbis: “Art. 26. Cabe à Câmara Municipal, com a devida sanção do Prefeito, legislar sobre quaisquer matérias de interesse e competência legal do Município, e especialmente, sobre: (...) XV - autorizar a alteração da denominação de bens próprios, vias e logradouros públicos; (...) Art. 47. Compete ao Prefeito, entre outras atribuições: (...) XIX - oficializar, obedecidas as normas urbanísticas, as vias e logradouros públicos, mediante denominação aprovada pela Câmara Municipal.” Todavia, o novel entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal admite competência comum ao Executivo (Decreto) e ao Legislativo (Lei Formal) para denominar logradouros públicos ou alterar as denominações dos mesmos, devendo o mandamento da Lei Orgânica Municipal ser interpretado à luz da concepção recém-consolidada. Neste julgamento, entendeu o STF que a denominação de logradouros públicos não se configura matéria de estruturação e organização administrativas a impor competência privativa da iniciativa do processo legislativo ao Chefe do Poder Executivo. Podem Legislativo e Executivo, tanto proporem normas gerais sobre denominação de vias e logradouros públicos, quanto - pelos meios normativos próprios - denominarem logradouros públicos específicos. Contudo, relevante dúvida repousa sobre como o Poder Público Municipal deve proceder quando o acesso que se pretende denominar (em que pese ser de uso irrestrito da população) se encontra em parcelamentos clandestinos/irregulares, sendo ainda integrantes formalmente de patrimônio particular, especialmente, considerando o estabelecido no art. 85, parágrafo único, da LOM, in verbis: “Art. 85. A implantação da infraestrutura básica e de equipamentos urbanos e comunitários, destinados ao atendimento da população de baixa renda, independerá de reconhecimento de seus logradouros, da regularização urbanística ou de registro das áreas e de suas edificações, ficando sujeita a critérios especiais de urbanização, previstos em lei. Parágrafo único. Os logradouros públicos que já apresentarem moradias habitadas, ainda que localizados em áreas não regularizadas e não convenientemente urbanizadas, receberão denominação oficial através de lei, levando-se em conta, preferencialmente, os nomes que a comunidade indicar, os quais em nenhuma hipótese, poderão contemplar pessoas vivas.” Objetivamente, tais acessos não podem ser caracterizados como logradouros públicos, ainda que dotados de infraestrutura básica e atendidos por transporte público. Aqueles são resultado de parcelamentos irregulares - seja pela atuação de loteadores que agiram na clandestinidade, seja devido a ações de esbulho possessório. Fato é que, no que se refere ao Poder de Polícia Preventivo vinculado à manutenção do ordenamento urbano, se estas ocupações existem, a omissão administrativa teve, também, papel de destaque. Os núcleos urbanos informais e, por consequência, os acessos irrestritos em áreas formalmente particulares, são numerosos em todo o território nacional e motivaram a criação de instrumentos legais com o propósito de promover a regularização, titulando os ocupantes e, também, transferindo para o domínio público as vias e logradouros irregulares. Especificamente, tem-se a vigente Lei Federal nº 13.465/2017 que instituiu os procedimentos de Regularização Fundiária Urbana de Interesse Social (Reurb-S) e a de Interesse Específico (Reurb-E) que são conduzidos pelos Municípios. No exercício da competência legislativa suplementar, insculpida no art. 30, II, da Constituição Federal, o Município de Juiz de Fora editou a Lei Complementar Municipal nº 90/2019 que trata das Regularizações Fundiárias de Interesse Específico (Reurb-E) em seu território. Cumpre acrescentar que, em tais procedimentos, prevê a Lei Federal nº 13.465/2017 que o registro da Certidão de Regularização Fundiária/projeto de regularização importa em abertura de matrículas individualizadas para as áreas públicas, in verbis: “Art. 44. Recebida a CRF, cumprirá ao oficial do cartório de registro de imóveis prenotá-la, autuá-la, instaurar o procedimento registral e, no prazo de quinze dias, emitir a respectiva nota de exigência ou praticar os atos tendentes ao registro. § 1º O registro do projeto Reurb aprovado importa em: I - abertura de nova matrícula, quando for o caso; II - abertura de matrículas individualizadas para os lotes e áreas públicas resultantes do projeto de regularização aprovado; (grifou-se) (...) Art. 53. Com o registro da CRF, serão incorporados automaticamente ao patrimônio público as vias públicas, as áreas destinadas ao uso comum do povo, os prédios públicos e os equipamentos urbanos, na forma indicada no projeto de regularização fundiária aprovado. Parágrafo único. A requerimento do Município, o oficial de registro de imóveis abrirá matrícula para as áreas que tenham ingressado no domínio público.” (grifou-se) Destaca-se, também, a previsão do art. 22, parágrafo único da Lei Federal nº 6.766/1979, in verbis: “Art. 22. Desde a data de registro do loteamento, passam a integrar o domínio do Município as vias e praças, os espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo. Parágrafo único. Na hipótese de parcelamento do solo implantado e não registrado, o Município poderá requerer, por meio da apresentação de planta de parcelamento elaborada pelo loteador ou aprovada pelo Município e de declaração de que o parcelamento se encontra implantado, o registro das áreas destinadas a uso público, que passarão dessa forma a integrar o seu domínio.” Verifica-se dos dispositivos retrotranscritos que o procedimento de regularização fundiária, regulado pela Lei Federal nº 13.465/2017, não é pré-requisito exclusivo para que o Município requeira a abertura de matrícula individualizada das áreas destinadas a uso público na hipótese de ocupações irregulares. Todavia, tais áreas/acessos/vias só se tornam públicos, ou passam a integrar o domínio público, com a abertura da matrícula junto ao Registro Geral de Imóveis. Assim, seja no caso de parcelamentos implantados e não registrados, seja na hipótese de regularização fundiária, o logradouro só se torna público com a abertura da Matrícula na Serventia Registral Imobiliária. Feitas estas observações, conclui-se que a competência para denominar logradouro tem por objeto apenas os de domínio público, ou seja, os que material e formalmente integrem o acervo imobiliário municipal. Denominações a acessos particulares, por tanto, não se incluem na competência legislativa municipal. Neste aspecto, o parágrafo único do art. 85, da Lei Orgânica Municipal, encerra uma impropriedade, na medida em que considera como públicos os acessos em ocupações irregulares particulares, em total afronta à Constituição Federal, que em seu art. 182, determina que a política de desenvolvimento urbano está adstrita às diretrizes fixadas em lei. Deste modo, tem-se que, no que diz respeito ao domínio das vias públicas decorrentes de parcelamentos, a Lei Federal nº 6.766/1979 tem caráter de lei geral urbanística, assim como a Lei Federal nº 13.465/2017, sendo considerado logradouro público e, deste modo, sujeitos à denominação pelo Poder Público apenas aqueles efetivamente matriculados junto ao Registro Imobiliário. Assim, proposições de autoria do Poder Legislativo versando sobre acessos particulares, como ocorre no presente caso, devem ser objeto de veto por parte do Poder Executivo por serem maculadas pela inconstitucionalidade. Igualmente, consoante a tese firmada no RE 1151237 - STF, denominação de acesso particular por ato normativo próprio do Poder Executivo estaria sujeito ao controle legislativo, nos termos do art. 49, V, da CRFB e do art. 27, IX da LOM.

Diante do exposto, espero e solicito a essa Egrégia Câmara que, em reexame da matéria, mantenha o presente veto.

Prefeitura de Juiz de Fora, 29 de abril de 2020.

a) ANTÔNIO ALMAS - Prefeito de Juiz de Fora.



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